sábado, 17 de maio de 2008

O brincar no desenvolvimento infantil


Armando Correa de Siqueira Neto *

Há na natureza uma sabedoria própria, um constante ensinar sobre aquilo que é natural e parte de nós seres humanos, o caminho essencial, que pode ter o mesmo número de configurações quanto de personalidades diferentes das pessoas. Este caminho natural, do desenvolvimento humano, tem características próprias, ao mesmo tempo em que é flexível frente às mudanças e conseqüentes adaptações das quais nos submetemos constantemente, porém, até o momento, uma delas, objeto de estudo neste trabalho, tem se mostrado fundamentalmente convicta de sua própria existência, competente nos seus efeitos, simples em seu conceito e dinâmica, e complexa no que se refere a sua atuação no ser humano, esta estrutura invisível, o brincar, tem todo este acervo de conteúdos em seu bojo, oferecendo a quem dele se utilizar, possibilidades naturais de sermos mais naturais, principalmente, na infância, onde construímos a nossa base principal, suporte para toda uma vida. Ser natural nos possibilita o melhor acesso a nós mesmos durante a vida, para que possamos nos observar, ora externa, ora internamente, e nessa alternância de constante re-conhecimento de si mesmo, lidemos com boa parte de nossos conteúdos, para que, finalmente, estejamos sempre nos permitindo continuar o caminhar do nosso desenvolvimento.
O brincar é essencial às crianças e nos revela de diversas formas que tem poder terapêutico natural, além de constituir auxílio na boa formação infantil, nas esferas emocional, intelectiva, social, volitiva e física. Esquecer-se do brincar é também esquecer de viver com qualidade de vida, e, ao oferecermos às crianças a possibilidade de brincar, oferecemos muito mais do que o ato em si mesmo, visível aos olhos, estendemos uma perspectiva de vida melhor, um desenvolvimento mais natural e eficiente, uma socialização decorrente de tão somente brincar, e ainda mais, a possibilidade de se reconhecer como ser, na terapia constante do expressar e concretizar criativamente os recursos internos de que dispomos.

Introdução
A proposta deste trabalho é a de transitar pelas experiências clínicas vividas por diversos profissionais de atuação junto à infância, que se utilizaram do instrumento lúdico em terapias e que deixaram uma rica e vasta teoria para novas e constantes pesquisas, e, relacionar este procedimento ao brincar natural, objeto em foco deste estudo, procurando sinalizar ao final da pesquisa, os valores que representam este mesmo brincar natural. Objetivamos entender se a natureza encontrada no brincar durante a infância tem efeitos positivos quanto ao desenvolvimento e em quais esferas ela acaba por atuar.

Referencial
De acordo com Cabral (2000) “Análise infantil é um método de diagnóstico e terapia infantil que combina os princípios da Psicanálise freudiana e as técnicas projetivas consagradas nos testes de Rorschach e de Murray (T.A.T.). A esse método deu Melanie Klein (Psicanálise da Criança, 1932) o nome de playtechnique, ou técnica de brinquedo, ou ainda ludoterapia, depois desenvolvida por outros psicanalistas da Escola de Londres, como D. W. Winnicott e Money Kyrle, e adotada no todo ou em parte por analistas de outras correntes. A análise infantil funda-se no princípio da catarse, uma vez que tenta explorar o mundo de sentimentos e impulsos inconscientes (os “fantasmas” infantis) como origem efetiva de todas as ações e reações observadas nos pequenos pacientes.”
Klein (1975) nos fala sobre as descobertas da psicanálise que resultaram numa criação de uma nova Psicologia Infantil. Por meio delas aprendemos que, já nos primeiros anos de vida, as crianças experimentam não apenas impulsos sexuais e angústia, como também sofrem grandes desilusões.
O caráter primitivo do psiquismo infantil requer uma técnica analítica especialmente adaptada à criança, e vamos encontra-la na análise lúdica. Por meio deste método obtemos acesso às fixações e experiências mais profundamente recalcadas da criança, o que nos possibilita exercer uma influência radical em seu desenvolvimento.
O terapeuta busca a comunicação da criança e sabe que geralmente ela não possui um domínio da linguagem capaz de transmitir as infinitas sutilezas que podem ser encontradas na brincadeira por aqueles que as procuram.
A fim de dar um lugar ao brincar, Winnicott (1971) postulou a existência de um espaço potencial entre o bebê e a mãe. Esse espaço varia bastante segundo as experiências de vida do bebê em relação à mãe ou figura materna, e eu contrasto esse espaço potencial (a) com o mundo interno (relacionado à parceria psicossomática), e (b) com a realidade concreta ou externa (que possui suas próprias dimensões e pode ser estudada objetivamente, e que, por muito que possa parecer variar, segundo o estado do indivíduo que a está observando, na verdade permanece constante).
É a brincadeira que é universal e que é própria da saúde: o brincar facilita o crescimento e, portanto, a saúde; o brincar conduz aos relacionamentos grupais; o brincar pode ser uma forma de comunicação na psicoterapia; finalmente, a psicanálise foi desenvolvida como forma altamente especializada do brincar, a serviço da comunicação, consigo mesmo e com os outros.
É no brincar, e somente no brincar, que o indivíduo, criança e adulto, pode ser criativo e utilizar sua personalidade integral: e é somente sendo criativo que o indivíduo descobre o eu (self).
Conforme Arzeno (1995) Devemos comunicar-nos com as crianças através da brincadeira ou jogo e de algumas palavras simples que possam captar claramente.
De acordo com Junqueira O desenvolvimento infantil se encontra particularmente vinculado ao brincar, uma vez que este último se apresenta como a linguagem própria da criança, através da qual lhe será possível o acesso à cultura e sua assimilação. O brincar se apresenta como fundamental tanto ao desenvolvimento cognitivo e motor da criança quanto à sua socialização, sendo um importante instrumento de intervenção em saúde durante a infância.
Molon nos diz (2001) “Em meu trabalho na clínica fica evidente a importância da atividade lúdica para as crianças. Nesta posição de descobridores adquirem novas habilidades (as funções do brincar estão ligadas à construção do próprio corpo), enfrentam emoções complexas e conflitantes reencenando a vida real.

Resultado de pesquisa
As informações resultantes do questionário de pesquisa apontam alguns dados que delineiam o nosso perfil quanto ao brincar durante a infância, bem como alguns aspectos ligados às funções clínicas da Ludoterapia e seus instrumentos inerentes.
Dos profissionais pesquisados, haviam algumas especialidades, dentre elas, da linha junguiana, psicanalítica e gestáltica.
Sobre a utilização e o porque da técnica ludoterápica, as afirmações indicaram a necessidade diante dos casos de tratamento psicológico e emocional, percepção do contexto familiar, na situação psicodiagnóstica e posteriormente na psicoterapia, para realizar aproximação e contato com a criança e estratégia de construção de conhecimento e auto-percepção.
A indagação, “No seu entender teórico-prático, a criança se expressa por meio do brinquedo?” , nos posiciona que, sim, todos os profissionais alegaram afirmativamente quanto as crianças se expressarem através do brinquedo enquanto brincam.
Sobre o efeito terapêutico da ludoterapia sobre a criança, foi possível perceber que, seis sétimos, em torno de 85% das crianças obtêm este resultado proposto pela técnica em questão.
A pergunta “Em que colabora o brincar na formação da criança?” , os resultados mostram que, 38,9% dos pesquisados alegou que o brincar colabora na formação emocional, intelectiva, volitiva, social e física, e, de outro lado, concordando integralmente com as questões emocional, intelectiva e social, descartando a volitiva e a física, montavam 61,1% dos entrevistados.
Considerar o brincar como parte da psicologia preventiva do ser humano obteve o resultado de 100% nas respostas, destacadamente, aquela onde se ressalta o termo “fundamental”.
Ao serem questionados quanto as formas de se brincar, qual teria os melhores recursos psicoterápicos para a criança, foi indicado que, 40% apontam as naturais, como o barro, as físicas e esportivas e as semi prontas e os jogos, 33,33% disseram ser as prontas, como a boneca, as manufaturadas, como a pipa e o playground, e, por último, 26,67% apontaram os eletrônicos.

Discussão
Da análise dos resultados obtidos desta pesquisa, relacionamos que no trabalho clínico, as pessoas que dele necessitam, visam buscar o eu (self) através de suas experiências criativas, e o instrumento brinquedo, em sua utilidade maior, o brincar, fornecem dados variados e fundamentais, que, do ponto de vista da ludoterapia, há uma utilização mais específica quanto ao diagnóstico e a terapia com o auxílio desta técnica, mas é evidente que ela se abre em novas possibilidades conforme percebido em cada profissional. Possibilidades estas, que derivam do ambiente terapêutico, tais como facilitar o contato com a criança, expressão de sentimentos, construção de conhecimento e auto-percepção, além de percepção do contexto familiar.
A questão ludoterapia foi enfatizada no entender teórico-prático dos entrevistados, os quais concordaram, na sua totalidade, que a criança se expressa por meio do brinquedo.
Foi notado que a maioria das entrevistas indicou que durante a ludoterapia clínica, a criança obtêm algum efeito psicoterápico, constatação esta, dentro do ambiente técnico da psicoterapia.
Indagamos se existiria algum efeito terapêutico na criança, apenas brincando, sem estar numa sessão, o que nos foi respondido, na sua maioria, que sim, a criança obtêm este efeito terapêutico. Alguns profissionais responderam que não, e outros que um pouco. Uma maioria indicadora de que o brincar natural, isto é, fora do cenário técnico, é gerador de efeito terapêutico, uma qualidade na vida das crianças que utilizam deste recurso tão antigo e nosso tema em voga. Dispomos que o brincar é por si mesmo uma terapia. Oferecer às crianças o brincar é em si mesmo uma psicoterapia que possui aplicação imediata e universal, e viabiliza a elas uma atitude social positiva com respeito ao brincar.
No desenvolvimento da criança podemos encontrar agentes colaboradores, através do brincar, tais como o fator social entre eles, a construção desta convivência em sociedade, o desenvolvimento emocional e intelectivo, para todos os pesquisados, cabendo ainda, o desenvolvimento volitivo e físico para 38,9% deles.

Conclusão
A pesquisa revelou que o brincar natural tem expressivo efeito terapêutico por si só, além de auxiliador no desenvolvimento infantil, nas esferas emocional, intelectiva, social, volitiva e física, demonstrando a sua fundamental importância neste período riquíssimo do ser humano, ou seja, a sua própria estruturação, a base construtiva do que tenderemos a chegar no desencadear de nossas vidas, dando-nos o asseguramento necessário para a progressão natural do ciclo vital humano.
O encerramento deste trabalho, apenas abre, ainda mais, a discussão sobre uma temática tão importante de nossas vidas, pois que já fomos crianças em algum tempo, o brincar natural, os brinquedos que fazem parte de nosso desenvolvimento. Cabe lembrar ainda, que trabalhos nesta direção podem e devem apontar hipóteses para a questão do convívio social, elemento pelo qual apenas esbarramos, sem nos atermos, haja vista a sua enorme dimensão. Pesquisas que possam somar informações e valores de como ocorrem os relacionamentos entre as crianças atualmente, dentro de seu universo do brincar, fonte de estruturação também no campo do progresso humano. E, por fim, ressaltar a proposta e objetivo desta pesquisa, sinalizando para quem dela tome posse, que, aquilo que já intuitivamente sabíamos pela natureza das coisas e a própria experiência humana é trazido neste trabalho, pela pequena colaboração científica encontrada nele, que, o brincar natural, tem no mínimo, o poder de colaborar no desenvolvimento das crianças, servindo-lhes ainda, como fonte terapêutica natural.

* Armando Correa de Siqueira Neto,
Psicólogo - Faculdade Paulistana de Ciências e Letras.

domingo, 6 de abril de 2008

A DISCIPLINA E A INDISCIPLINA COMO FATORES FUNDAMENTAIS DE FORMAÇÃO DO ALUNO CRÍTICO NO MUNDO ATUAL


Mário Sérgio Vasconcelos*
Pós-doutor em Psicologia Cognitiva pela Universidade de Barcelona; Doutor em Psicologia Escolar pela USP/SP;
Mestre em Psicologia Social pela PUC/SP


A sociedade contemporânea passa por um momento singular em que as mudanças são muito expressivas. A cada dia, surgem novas tecnologias que influenciam nosso ritmo de vida e alteram as relações entre as pessoas. A inserção irreversível da mulher no mercado de trabalho tem provocado sensíveis transformações no modelo familiar e, com isso, diferentes instituições educacionais são criadas para atender ou cuidar de nossas crianças. As mudanças são tantas nos mais variados setores, que podemos dizer que hoje vivemos não uma época de mudanças, mas uma mudança de época. Estamos no terceiro milênio, globalizados e numa sociedade de mercado em busca da modernização.
Nesse contexto, muitas pessoas sentem-se inseguras quanto ao seu futuro e ao das crianças, não sabendo em quem e no que acreditar. Pais não têm certeza de como educar. Consideram ultrapassados os valores transmitidos pela tradição e se vêem indecisos em saber qual o melhor caminho a seguir. As crianças e adolescentes resistem em respeitar os limites que visam a assegurar uma convivência verdadeiramente democrática e, em alguns casos, reina uma falta de compromisso com tudo e com todos.
No contexto escolar, os professores também estão em dúvida sobre quais caminhos seguir. Em visitas às escolas, temos observado, com freqüência, professores afirmarem, por exemplo, que os alunos perderam o respeito pelas pessoas, que já tentaram de tudo e não sabem o que fazer. Desse modo, manifestam que os bons valores de outrora estão sendo desconsiderados e analisam tal fenômeno como plena crise de moralidade. Essa situação traduz uma ótica pessimista e nos conduz, inevitavelmente, a uma reflexão sobre os valores morais e a ética do cotidiano escolar.
Sem dúvida, as mudanças contemporâneas são motivos que fazem da ética tema de interesse para vários segmentos. A palavra ética está presente nos jornais, nas rádios, na TV, nas livrarias e adentrou também o contexto escolar por meio dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN). A ética tornou-se tema transversal indicado para compor a formação do aluno. Pensar a ética no contexto escolar é hoje, pois, uma exigência de lei, que tem por objetivo problematizar valores e regras, visando ao desenvolvimento moral.
Porém é preciso saber de qual ética realmente se fala no cotidiano escolar. Em pesquisa que realizamos com 756 professores de 5 estados brasileiros, tendo por objetivo desvelar as concepções que professores de várias séries de escolas publicas e particulares têm sobre “ética”, constatamos que 78,6% valorizam o termo quando associado à disciplina e indisciplina na escola. Estão imediatamente interessados em estabelecer controles para os comportamentos que consideram inadequados nos alunos.
Na mesma pesquisa, os professores teceram várias explicações para a origem e motivos da indisciplina. A grande maioria (83,4%) atribui as causas da indisciplina a fatores externos à escola. Dizem, por exemplo, que o comportamento indisciplinado vem da família que não soube educar, é conseqüência da violência transmitida pelos meios de comunicação, vem da condição de pobreza dos alunos e do uso de drogas. Uma parcela bem menor (17,6%) de professores atribui a indisciplina a fatores internos ao contexto escolar, como, por exemplo, problemas da escola e falta de preparo do professor.
Com essa leitura da realidade, majoritariamente ancorada em um determinismo externo prévio sobre a indisciplina, ficamos diante de uma espécie de imobilismo no sistema educacional para lidar com a questão. Desse modo, a escola e os professores não podem fazer nada, se vêem desprovidos de mecanismos de atuação e sentem-se isentos de cumprir o seu papel de facilitadores do processo de constituição do sujeito aluno. Assim, movidos pelas incertezas provocadas pelas mudanças contemporâneas, os professores reforçam uma concepção de escola instrucional, muito distante de uma escola formadora necessária à constituição de alunos que saibam lidar com as tendências, diversidades e complexidade de um mundo globalizado.
Atualmente um aluno, mesmo sem freqüentar a universidade, pode permanecer três anos na pré-escola, oito anos no ensino fundamental e três anos no ensino médio. São, no mínimo, quinze anos de escolarização. Considerando todo esse tempo que o aluno passa na escola, não seria o caso de admitir que muitos aspectos organizadores da indisciplina são produzidos no próprio contexto escolar? Além disso, é preciso indagar se a indisciplina é constituída apenas por aspectos negativos.
Do ponto de vista da construção sócio-histórica da infância, a indisciplina sempre existiu. Do ponto de vista da psicologia do desenvolvimento ela é, inclusive, necessária para a superação de limites impostos pelos adultos, até porque nem sempre os adultos estão corretos em suas concepções. Imaginem se nós não tivéssemos sido indisciplinados com as ditaduras instauradas no Brasil no século passado. Provavelmente ainda estaríamos vivenciando um regime extremamente autoritário.
O fato é que a disciplina e a indisciplina são dialeticamente constituintes das relações humanas e da dinâmica das instituições. Então, por que situá-las como algo externo e que não faz parte das relações interpessoais escolares? A disciplina que atualmente perpassa o meio escolar, como em décadas passadas, ainda está direcionada apenas ao desejo do professor de obter comportamentos de obediência dos alunos. Está dirigida ao um respeito unilateral, que tem como finalidade obter a tranqüilidade da sala de aula, o silenciamento e a passividade do aluno. Qualquer variação ao respeito unilateral é interpretada como ato indisciplinado e negativo. Diante desse quadro, o que fazer?
Penso que é preciso reorientar o debate para uma visão inclusiva da indisciplina no contexto escolar. Para uma análise mais completa e ampla sobre a indisciplina, precisamos considerar muitas variáveis presentes nessa realidade. É preciso levar em conta os aspectos culturais, econômicos, institucionais e psicológicos envolvidos nessa questão. Sabemos também que não é possível, num passe de mágica, alterar a escola e as representações que os professores fazem a respeito da disciplina e da indisciplina no contesto escolar. Contudo algumas ações estão ao alcance imediato dos educadores. Nesse sentido, com a intenção de promover aquilo que denominamos de visão inclusiva da indisciplina, vamos apontar dois aspectos que consideramos importantes de serem relevados:
a. A construção da disciplina e da indisciplina das crianças está diretamente relacionada à tomada de consciência das regras sociais. Tal afirmação implica a necessidade de compreendermos as relações entre a construção do pensamento e a internalização dos limites e das regras sociais pelas crianças e adolescentes no contexto educacional contemporâneo. Sabemos que os limites estabelecidos pelos adultos são fundamentais para a organização do mundo do sujeito. As regras provocam a reflexão para a tomada de consciência e promovem a prospecção do pensamento e dos desejos. Promovem a reorganização funcional do sujeito. As crianças reorganizam-se cognitivamente e afetivamente ao compreenderem, negarem ou tentarem superar as regras. Ao negá-las e superá-las, alguma forma de “indisciplina” sempre esteve presente no desenvolvimento humano.
b. os conflitos são inerentes às relações interpessoais e são fundamentais para o desenvolvimento do pensamento crítico. A indisciplina gera conflitos. É preciso admitir o conflito no contexto escolar. Analisá-lo e torná-lo mais transparente são formas de possibilitar uma convivência institucional democrática e adequada à síntese reversível e crítica. Analisar um conflito supõe analisar os elementos que o compõem, suas causas e não apenas os motivos aparentes que permitiram sua manifestação. Não é papel do professor camuflar um conflito, mas sim possibilitar estratégias que possam propiciar aos alunos o debate e o levantamento de hipóteses para a resolução do conflito. O pressuposto para a construção de um aluno crítico é avançar na exploração da transparência institucional.
Pensamos que proposições dessa natureza possam auxiliar a escola a compreender que a disciplina e a indisciplina são fatores constituintes de formação do aluno crítico no mundo atual. Talvez possam auxiliar na construção de um projeto pedagógico mais próximo das tendências do desenvolvimento humano e contribuir para a elaboração de uma proposta escolar consciente de que o aluno não é, o aluno “está sendo”.
*vascon@assis.unesp.br

quinta-feira, 17 de janeiro de 2008

Bagunceiros podem se sair tão bem quanto comportados na escola


AMARÍLIS LAGEda Folha de S.Paulo

Camila Duarte Silva Corbo nunca foi exatamente um exemplo de aluna bem comportada. Agitada, batia nos colegas de turma, era indisciplinada e, se os professores lhe pedissem algo no qual ela não via grande utilidade, simplesmente não obedecia. O exato oposto de sua irmã, Paula, considerada por todos na escola uma criança muito tranqüila e sociável.
A expectativa de Cristina Duarte Silva, mãe delas, seguia a crença comum: crianças comportadas vão bem na escola, enquanto as bagunceiras ficam de recuperação. A surpresa veio no boletim: Camila, a agitada, sempre tirava notas altas.
Já Paula repetiu de ano duas vezes e sempre precisou de professor particular --ainda mais quando o assunto era matemática. "Até hoje não sei onde vou usar uma equação na minha vida", brinca Paula, atualmente com 20 anos e estudante de moda.
"Eu sempre gostei muito de estudar, principalmente matemática e ciências", conta Camila, 23, formada em educação física. Exceção à regra? Não exatamente. Um estudo recém-divulgado nos EUA defende que, ao contrário do que se pensava, o comportamento não é um fator determinante para o sucesso acadêmico.
Os pesquisadores avaliaram seis levantamentos envolvendo estudantes dos EUA, do Canadá e do Reino Unido. Na primeira fase, foram coletados dados sobre o comportamento e as habilidades das crianças quando elas estavam na pré-escola (hoje chamada de educação infantil). Anos depois, quando as mesmas crianças estavam no ensino fundamental, os dados iniciais foram comparados com as notas que elas alcançavam em testes e com relatórios de professores.
A análise revelou que os melhores alunos tinham uma característica em comum: fossem briguentos ou calmos, eles geralmente possuíam, desde pequenos, boas noções de matemática. Em segundo lugar, estava a noção de linguagem --quanto mais a criança dominava aspectos relacionados a leitura, escrita e vocabulário no ensino infantil, melhores eram suas notas nos anos seguintes.
Dentre os aspectos comportamentais, o único fator relevante para a aprendizagem foi a capacidade ou não de manter a atenção, segundo a pesquisa. Outras questões, como agressividade, desobediência, ansiedade e impulsividade, não foram relacionadas ao desempenho escolar das crianças nas fases posteriores.
O estudo contraria outras pesquisas já feitas nas áreas de desenvolvimento infantil que associam o mau comportamento a um pior rendimento escolar. No ano passado, por exemplo, um estudo publicado no "Journal of Educational Psychology" também acompanhou alunos do ensino infantil à quinta série e constatou que crianças que não se dão bem com as outras deixam de se envolver nas atividades na sala de aula e aprendem menos.
"Uma associação simples sugere que crianças que não se adaptam tendem a aprender menos", disse à Folha Greg Duncan, professor da Universidade de Norhtwestern (EUA) e coordenador da nova pesquisa. "Mas essa relação entre o comportamento na pré-escola e a aprendizagem nos anos seguintes desaparece quando levamos em conta o conhecimento [de noções de matemática e linguagem] que as crianças já tinham."
Maria Irene Maluf, presidente da Associação Brasileira de Psicopedagogia, confirma o resultado da pesquisa de Duncan: mau comportamento nem sempre significa notas baixas e bom comportamento não garante sucesso escolar.
Ainda assim, ela critica aspectos do trabalho, em especial o fato de o sucesso acadêmico ser medido basicamente pela aquisição de conteúdo. "O papel da escola mudou", afirma Maluf. "Antes, a função era informar. O professor passava as informações como uma enciclopédia. Hoje, o professor é um mediador da aprendizagem, incluindo a aprendizagem social. É preciso formar o cidadão --uma pessoa capaz, autônoma e consciente. Esse trabalho começa na pré-escola, pois ninguém vai formar um cidadão aos 18 anos de idade."
"O principal objetivo da educação infantil não é o conteúdo acadêmico. O aluno não está preparado para assimilar conceitos. A criança dessa faixa etária tem noções de tempo, de números, mas a assimilação de conceitos só vai acontecer aos sete anos", afirma Fernanda Gimenes, coordenadora pedagógica da educação infantil e do primeiro ano do ensino fundamental do colégio Pueri Domus em Barueri (SP).
Para ela, a educação infantil tem efeitos positivos na vida escolar do aluno quando o trabalho realizado é integral, contemplando o desenvolvimento tanto de aspectos psicológicos e afetivos quanto das habilidades cognitivas das crianças.
Para Maluf, o acompanhamento adequado nessa fase é fundamental porque é até os seis anos que se formam as principais características da personalidade da criança. "Se não mexer enquanto ela é novinha, depois fica muito mais complicado. Se ela continuar agressiva no ensino fundamental, por exemplo, o professor tenderá a mandá-la para fora da sala de aula -o que é errado- e ela aprenderá menos."
Em sua pesquisa, o norte-americano Greg Duncan observou uma continuidade de problemas sociais e emocionais nas crianças que já apresentavam esse perfil aos cinco ou seis anos. "Mas isso é variável. Alguns problemas foram persistentes, mas outros, transitórios", disse.
É normal?
É essa variação que aflige muitos pais: como saber se a agressividade ou a ansiedade do filho é resultado de uma situação temporária ou sinal de um problema mais sério?
Especialistas afirmam que o primeiro passo para responder a essa questão é avaliar o próprio ambiente familiar. "Os pais devem se perguntar: eu educo bem, dou limites? Cerca de 90% dos problemas de comportamento de pré-escolares se devem à falta de educação por parte dos pais e só 10% estão relacionados a patologias neuropsiquiátricas", diz Maluf.
Alunos que não respeitam os colegas, por exemplo, podem estar apenas repetindo atitudes que vêem em casa, diz ela. Outro agravante é a superproteção: crianças que são protegidas em excesso pelos pais podem ter mais dificuldade para lidar com frustrações e reagir pior quando suas necessidades não forem atendidas.
Além disso, a agitação pode ser uma reação a fatores estressantes. "Mudanças bruscas, como a separação dos pais, e excesso de estímulos, como cursos de inglês, de balé etc., podem deixar a criança agitada. Nesse caso, seu comportamento é uma reação a uma situação ruim", afirma Luiz Renato Rodrigues Carneiro, professor de neurociência das universidades Ibirapuera e Mackenzie, em São Paulo.
Segundo ele, também é fundamental observar aspectos como a freqüência e o local em que os problemas ocorrem. A criança bateu só uma vez em um coleguinha ou isso se repete todos os dias? O mau comportamento ocorre em todos os locais ou em um ambiente específico, como a escola?
De acordo com as respostas a essas perguntas, pode ser indicado procurar um profissional especializado para fazer um diagnóstico da criança.
Entre as patologias, uma das causas mais comuns de problemas de comportamento é o TDAH (transtorno de déficit de atenção e hiperatividade), que, estima-se, atinge 5% das crianças em idade escolar.
TDAH
Iannis Castilho Farjo, 13, está nesse grupo. Há cinco anos, ele começou a se desinteressar pelo ambiente escolar. Na época, isso foi associado à mudança de colégio. Como o problema persistiu nos anos seguintes, a pediatra e os professores do menino sugeriram que sua família o levasse a um neurologista, onde ele foi diagnosticado com o transtorno.
"Foi uma surpresa", conta a professora Kathia Castilho, 46, mãe de Iannis. Afinal, o menino não era extremamente agitado. O que ela não sabia é que nem toda criança com TDAH apresenta o "quadro completo": algumas podem ter déficit de atenção e não serem hiperativas e outras, embora sejam muitas agitadas, podem não ter problemas de concentração.
Para aumentar sua capacidade de atenção, Iannis começou a fazer atividades como tocar violão e praticar kung fu. O processo foi acompanhado na escola por meio de medidas especiais, como a possibilidade de as provas serem acompanhadas de perto por um professor, que verifica se o aluno prestou atenção na pergunta e entendeu o que está sendo pedido.
Com o tempo, Iannis recuperou as boas notas --vai bem principalmente em geografia. A disciplina favorita? "Educação física", brinca ele.
Embora o TDAH não seja um transtorno de aprendizagem, até 30% dos casos costumam ser acompanhados por problemas desse tipo, como a dislexia, afirma Fabio Barbirato, chefe de psiquiatria da Santa Casa da Misericórdia do Rio de Janeiro e professor da PUC-RJ (Pontifícia Universidade Católica).
Além disso, diz, pesquisas têm observado cada vez mais a ocorrência do TDAH com outros problemas, como depressão e transtorno bipolar. O ideal, afirma, é que qualquer transtorno seja identificado o antes possível, já que isso facilita o tratamento.

terça-feira, 15 de janeiro de 2008

Confira dicas para brincar melhor com os filhos



AMARÍLIS LAGEda Folha de S.Paulo

Leonardo Wen/Folha Imagem

www1.folha.uol.com.br



Então você estudou, acumulou uma grande experiência, aprendeu várias línguas, sabe trabalhar em grupo e busca se manter atualizado. Mas, para completar o currículo de pai ou mãe, é preciso mais um pré-requisito: você sabe brincar?

Saber brincar tem como resultado um vínculo ainda mais forte entre pais e filhos
Não se trata aqui de dar o carrinho de última geração, jogos eletrônicos ou bonecas que cantam, dançam e dão piruetas, e sim de acompanhar os filhos durante as brincadeiras: sentar no chão, botar a mão na massa e se soltar um pouco de regras e objetivos pedagógicos.
Essa interação faz com que as crianças se sintam protegidas e valorizadas e permite que os pais as conheçam melhor. O resultado é um vínculo ainda mais forte entre ambos.
"Alguns adultos parecem ter esquecido como brincar. Mas quem tem dificuldades precisa se adaptar e arranjar um jeito de brincar com o filho. Quem não tem vocação para fantasiar pode tentar fazer um exercício junto, ler um livro etc. Mas, principalmente, observar a criança, para se familiarizar com a linguagem dela", sugere Maria Irene Maluf, presidente da Associação Brasileira de Psicopedagogia.
Para auxiliar nessa redescoberta do universo lúdico, a Folha pediu para especialistas apontarem os erros mais comuns dos pais. Veja a seguir quais são os "sete pecados capitais" do playground e aprenda como agir para ser promovido a "pai ludens".
1 Achar que brincadeira é perda de tempo
A cena: Na agenda da criança tem escola, curso de línguas, aulas de esportes etc. Só não tem tempo para pular amarelinha ou empinar pipa. Para muitos adultos, brincar não é uma prioridade, e sim uma atividade supérflua.
Comentário: Brincar é algo fundamental para o desenvolvimento da criança. É por meio de jogos e de situações de faz-de-conta que ela compreende as regras sociais, desenvolve habilidades físicas, aprende a lidar com os próprios sentimentos e se prepara para os desafios da vida adulta.
Quando os pais participam da brincadeira, as vantagens são muitas para os dois lados. "Os pais são os principais parceiros da criança. Eles podem oferecer a ela um repertório de brincadeiras que ela não conhece e também ampliar a forma de brincar. Quando os pais se propõem a fazer isso, eles ajudam no desenvolvimento da criança", afirma a pedagoga Edilene Modesto de Souza, pesquisadora auxiliar da brinquedoteca da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo).
Além disso, a brincadeira facilita a construção de vínculos com o filho. "Na brincadeira, a criança se expõe, ela externaliza o que está sentindo e fala de coisas internas que, às vezes, os pais desconhecem. Isso os ajuda a conhecer mais o filho", ressalta a pedagoga.
2 Querer ser "o dono" da brincadeira
A cena: Convencido dos benefícios que brincar com o filho traz, o pai se aproxima da criança com uma caixinha de ferramentas. A caixinha é logo transformada em avião, mas o pai quer brincar do "jeito certo", ensinando o filho a encaixar o parafuso de plástico no suporte.
Comentário: O lado meio "mandão" dos adultos é um dos primeiros aspectos apontados pelas especialistas ouvidas pela Folha. "Muitos pais dizem 'vamos jogar bola' sem perguntar ao filho se ele quer mesmo jogar bola", comenta Marilena Flores, presidente da IPA (Internacional Playing Association, no Brasil, Associação pelo Direito de Brincar).
O adulto também não precisa encarar a brincadeira como o momento de "ensinar alguma coisa à criança". Alguns jogos, como damas, realmente têm regras, e as crianças precisam de alguém que as mostre como jogar. Mas elas também são capazes de criar suas próprias regras: ao brincar de casinha, por exemplo, podem estabelecer que a girafa é "mãe" do cachorro e que a banheira fica na sala. Dentro do contexto, isso será o "certo" e deverá ser respeitado.
Em outros casos, a criança pode tentar montar uma torre, por exemplo, encaixando as peças de um jeito errado -e os pais não precisam ficar corrigindo seus movimentos. "O que é eficaz na brincadeira é o exercício do ensaio e do erro. Se o adulto dirige demais, esperando um resultado, aquilo deixa de ser brincadeira e vira uma relação formal, um exercício didático, que é angustiante para a criança", afirma Gisela Wajskop, diretora do Instituto Superior de Educação de São Paulo/ Singularidades.
3 Ficar ansioso
A cena: A sobrinha do vizinho já sabe empilhar blocos de madeira. Mas seu filho, da mesma idade, ainda não consegue fazer isso. É o suficiente para o pai ficar preocupado com o desenvolvimento do menino, com medo de que ele esteja "atrasado".
Comentário: Toda criança tem seu próprio ritmo. Desrespeitar isso, para "acelerar" a aprendizagem do filho, pode ser prejudicial. "Isso desorganiza a experiência da criança, que se sente incapaz e frustrada por não conseguir responder à expectativa dos pais e pode pode passar a exigir muito de si mesma", explica a psicóloga Vera Zimmermann, coordenadora do Cria (Centro de Referência da Infância e Adolescência da Universidade Federal de São Paulo).
A pedagoga Edilene Souza dá uma dica para os pais. "A sensibilidade para o desenvolvimento da criança pode ser feita por meio de desafios. O pai pode colocar uma situação nova para a criança e ver como ela reage. Depois, oferecer novas possibilidades para explorar aquele brinquedo, sempre colocando um desafio a mais. Se o desafio for muito grande e ela desistir de brincar, você perceberá que aquele é o limite dela."
4 Ser superprotetor
A cena: Os pais anseiam por um desenvolvimento veloz do filho, mas, paradoxalmente, impedem que a criança tenha uma série de experiências que a ajudariam a progredir. O menino quer brincar na areia? Não pode. Escalar no trepa-trepa? Também não. Tudo por medo de que ele possa se machucar ou adoecer.
Comentário: A preocupação não é infundada. De acordo com um levantamento divulgado neste mês pela ONG Criança Segura, os acidentes são a principal causa de morte de crianças e adolescentes de um a 14 anos. Mas o cuidado não pode prejudicar a autonomia da criança, fundamental para que ela possa se desenvolver plenamente. O importante é ficar de olho nelas, sem podá-las em excesso.
"Conheço muitas mães que vivem com o filho no colo, dão comida na boca, entregam o brinquedo na mão e depois reclamam que ele ainda não aprendeu a andar. Criança tem que cair algumas vezes. Só assim ela vai aprender a andar direito. Claro que é preciso minimizar riscos -não vamos deixá-la subir numa árvore muito alta, por exemplo", comenta Glaucia Maciel, diretora do centro de desenvolvimento infantil Steps Baby Lounge.
Um pouco de "sujeira" também é bom, afirma Marilena Flores, da IPA. "Crianças pequenas têm um vínculo muito forte com a natureza: gostam de mexer com terra, água, plantas e animais. Esse contato é bom para o desenvolvimento sensorial delas."
5 Ser sexista
A cena: A filha quer um carrinho. O filho quer uma boneca. E o pai quer convencer as crianças a optarem por outros brinquedos. Embora se preocupem com brincadeiras de conteúdo violento ou racista, muitos adultos mantêm uma orientação sexista na hora de brincar com as crianças.
Comentário: Ao brincar, a criança faz projeções da sociedade em que vive, que tem tanto homens quanto mulheres. Assim como as mulheres dirigem e os homens cuidam dos filhos, a menina pode brincar de carrinho e o menino, de boneca. Segundo especialistas, isso não interfere de forma alguma na sexualidade da criança. "O problema ocorre se os adultos ficarem recriminando-a e reforçando que 'isso é coisa de mulherzinha'. A gente precisa largar alguns paradigmas", afirma Marilena Flores.
6 Intervir nos conflitos
A cena: O pai vê seu filho discutindo com outra criança durante um jogo. Em seguida, entra no meio da confusão, briga com todo mundo e avisa que a brincadeira acabou.
Comentário: Mais uma vez, o ideal é estimular a autonomia das crianças. Um dos benefícios de brincar é desenvolver o autocontrole e aprender a negociar com o outro até encontrar uma solução.
Nem sempre, porém, essa liberdade é possível. Até os dois anos, a criança não tem noção dos limites entre ela e outras pessoas e, quando frustrada, vai reagir fisicamente.
À medida que cresce, ela entende melhor esses limites e pode resolver os problemas com os coleguinhas por meio da fala, mas isso vai depender da capacidade de comunicação da criança.
Se houver agressão física, o pai deverá intervir. O erro, porém, é adotar uma postura violenta. "Depois, é importante chamar a criança para analisar a situação. Perguntar por que o coleguinha ficou bravo, o que ela sentiu, o que poderia ter feito de diferente. Isso favorece a reflexão", afirma Vera Zimmermann, da Unifesp.
7 Ser politicamente correto
A cena: Bater no coleguinha, claro, é errado. Mas e brincar de luta? O conteúdo violento de algumas brincadeiras deixa muitos pais em dúvida na hora de permitir ou não que os filhos façam algo.
Comentário: "Muitas vezes, os pudores dos adultos limitam a criança. Eles não percebem que a brincadeira pode ser uma leitura crítica que ela faz de algum assunto", afirma Gisela Wajskop. Ela explica que, quando a criança canta "atirei o pau no gato", por exemplo, isso a ajuda a lidar com uma violência simbólica e a ter controle sobre isso. O mesmo vale para o castigo à bruxa ou aos ogros no final dos contos de fadas.
Além disso, afirma ela, os jogos de guerra, tradicionais em todas as culturas, "oferecem contato físico, ajudam a criança a lidar com a idéia de força e fraqueza e a testar a resistência à dor."
Mas é preciso prestar atenção para saber se a agressividade manifestada nas brincadeiras não reflete uma exposição do filho a uma realidade violenta. "O pai não deve ficar preocupado, mas atento. Se a criança estiver muito violenta, pode estar repetindo o que vê."

segunda-feira, 14 de janeiro de 2008

Mapa da mina para pais e mães angustiados

MÁRCIA DETONI
da Folha de S.Paulo
www.folha.uol.com.br

"Em que escola colocar o meu filho? Devo optar por uma mais tradicional, já que a educação em casa é liberal? Ou procurar a que prioriza o conteúdo, já que o mercado de trabalho não está brincadeira? Se bem que dizem que uma escola perto de casa é melhor!" É difícil encontrar pais que não passaram ou não vão passar por angústias desse tipo, seja na escolha da escola que a criança vai frequentar ainda de fraldas ou do colégio de ensino fundamental.

Para começar, desista de encontrar a melhor escola -ou a escola mais "forte", como dizem alguns. Os especialistas simplesmente garantem que ela não existe. "O que existe são escolas que priorizam o conteúdo e escolas que privilegiam as atividades que estimulam a curiosidade, o gosto pelo saber, a cidadania e o pensamento autônomo", diz a psicopedagoga Glaura Fernandes. Mas todas têm de cumprir o currículo mínimo determinado pelas políticas educacionais do país.

"E qual das duas linhas é a melhor?", perguntaria alguns dos pais angustiados. A psicóloga e colunista da Folha Rosely Sayão diz que, para encontrar o melhor caminho, os pais devem fazer outra pergunta a si mesmos: "Como eu gostaria que meu filho fosse educado?".

Do ponto de vista prático, os pais devem, primeiro, visitar a escola e questionar amplamente a sua proposta pedagógica (leia na página 13 uma relação de critérios básicos a serem observados na pré-escola e no ensino médio e fundamental). Depois, é preciso analisar se a linha da escola é adequada aos valores da sua família e também ao temperamento da criança, diz Sayão.

A tendência atual da escola, segundo o professor da Faculdade de Educação da USP Julio Groppa Aquino, é preparar o aluno para a vida, e não para o mercado de trabalho. Ele adverte que escolas muito preocupadas com o conteúdo acabam estressando a criança com excesso de informação e tarefas só para que o pai sinta que o filho está pronto para o mercado de trabalho.

"Isso não faz sentido. O aprendizado tem de ser lento, não é preciso ter pressa. É melhor que a criança saiba pouco, mas bem, do que saiba muito, mas mal", diz Aquino, acrescentando que o ensino voltado para o vestibular "só imbeciliza a criança".

O professor Sylvio Gomide, presidente do Grupo (associação que reúne 44 escolas particulares da capital paulista), observa que o próprio vestibular está começando a mudar e que muitas universidades, como a USP e a Unicamp, já estão avaliando a capacidade crítica e a autonomia de pensamento do vestibulando.

"A tendência hoje é investir cada vez mais em formação. Com tantos meios disponíveis, as crianças recebem muita informação fora da sala de aula. Quando o professor vai abordar um assunto, o aluno já teve contato com ele na internet ou em outro lugar", comenta.

Questões como cidadania e ética, segundo Gomide, também recebem atenção nas escolas particulares elitizadas (o preço médio da mensalidade nas escolas do Grupo é R$ 550). "Não era assim antes dos anos 80, mas, de uns tempos para cá, virou preocupação constante da escola particular fazer com que as crianças de famílias com mais dinheiro estejam "plugadas" na realidade do país", afirma.

Mas essa opinião tão categórica dos especialistas não é facilmente assimilada pelos pais, mesmo por aqueles que, no início da vida escolar dos filhos, optaram pelo método mais atual.

Ao escolher a pré-escola dos filhos, Jonas, 5, e Theo, 2, a economista Gládis Ribeiro e o marido tinham claro o que queriam para filhos: uma escola que desenvolvesse a curiosidade e estimulasse o amor pelo conhecimento. O casal optou pela Escola Viva, localizada no bairro Vila Olímpia, na zona sudoeste de São Paulo, cuja linha pedagógica, segundo Gládis, prioriza o aprendizado através das artes e de vivências do cotidiano.

Apesar de gostar do método moderno usado na educação de seus filhos, ela ainda não decidiu se vai manter as crianças na mesma escola quando chegarem ao ensino fundamental. Não foi uma boa escolha? "É impossível um pai estar 100% satisfeito porque sempre há dúvidas", diz ela. "A linha pedagógica é mais experimental, e não sei se eles vão conseguir competir com alunos das escolas tradicionais, que recebem mais conteúdo", comenta.

As dúvidas de Gládis sobre o peso do conteúdo na formação escolar são as mesmas de muitos pais educados pelos métodos pedagógicos de 30 anos atrás, que tiveram de decorar muitas fórmulas e conceitos para passar no vestibular e seguir uma carreira.

Seja qual for a opção de escola, preste muita atenção à reação de seu filho, ele é um termômetro valioso. Se estiver feliz e interessado em aprender, é um sinal de que a escolha foi boa. Se estiver desanimado e com rendimento escolar baixo, converse com os professores e orientadores pedagógicos dele, diz Fernandes.

Isso não significa que conflitos na escola são motivo para mudança. "Nem sempre é necessário mudar de escola. Às vezes, a criança está muito cansada, e é preciso apenas recuar na carga horária", diz Fernandes. Outras vezes, o problema pode ser solucionado com a ajuda de um orientador ou de um psicólogo.

O publicitário Paulo Labriola, 43, percebeu que seu filho, Pedro, 10, um garoto introspectivo e com boas notas, estava tendo dificuldades no relacionamento com os colegas. Labriola conversou com os orientadores da escola Vera Cruz, no bairro Alto de Pinheiros, zona oeste de São Paulo, e chegou à conclusão de que mudar não seria a solução.

"Tenho amigos que já tiveram problemas e foram mudando de escola até encontrar a que se encaixava, mas não era o caso. Pedro, por ser filho único, não tinha treino de relacionamento", comenta. Pedro teve sessões de terapia e hoje está contente.

Mas, se o aluno em questão é um adolescente e a idéia de trocar de escola o agrada, a medida é positiva, porque trará novos conhecimentos e oportunidades. A criança não precisa, necessariamente, frequentar a mesma escola do fundamental ao ensino médio, diz Fernandes.

Se, durante o processo de escolha da escola, é aconselhável que os pais promovam um amplo questionamento a respeito dos métodos da instituição, após tomada a decisão, eles devem delegar. É um erro bastante comum atravessar o ano letivo discutindo com a escola os procedimentos dos professores no dia-a-dia. Feita a matrícula, dê o necessário voto de confiança.

Lembre sempre também que a escola é responsável apenas por uma parte da formação da criança. "Quem educa o filho é o pai", salienta Sayão.

quinta-feira, 10 de janeiro de 2008

A influência da informática no desenvolvimento infantil

Por:
Wagner Antonio Junior
Faculdade de Ciências
UNESP – campus de Bauru
wag.antonio@gmail.com
pedagogia.brasilescola.com

Um dos objetivos da introdução dos computadores na vida das crianças é que esta tecnologia estimule suas mentes e potencialize seu desenvolvimento intelectual, paralelamente ao seu desenvolvimento psicossocial, uma vez que sua coordenação motora está se estabelecendo concomitantemente a seus gostos e relações sociais.
A proposta de utilizar os computadores no processo educativo desde as séries iniciais é de Papert, pois segundo sua proposta o computador iria “ampliar a escola”, revolucionar a educação e reformular a mente das crianças. Sua linguagem de programação, projetada especialmente para crianças, deveria provocar o estímulo para essa revolução. Influenciado pelo psicólogo e filósofo Jean Piajet, com quem estudou, Papert afirma ter combinado complexas teorias de desenvolvimento infantil de Piajet com seu próprio trabalho no campo da inteligência artificial.

Essa fusão aparente levou à criação da linguagem Logo, que Papert esperava a sistematização do uso de computadores no aprendizado, iniciando-se na pré-escola ou até mesmo em anos anteriores.

No sistema educacional brasileiro a implantação de computadores nas escolas é mais comum a partir do início do Ensino Fundamental, embora algumas instituições iniciem esse processo desde a Educação Infantil, o que, no entanto, não representa um número expressivo. Portanto, segundo a realidade brasileira, os primeiros contatos da criança com o computador em seu processo de aprendizado se darão, aproximadamente, a partir dos seis a sete anos de idade.

Segundo Erickson, a criança dessa faixa etária encontra-se na fase de latência na teoria freudiana, esta é a idade do domínio versus inferioridade, que vai dos seis aos doze anos. A principal realização deste estágio de aprendizagem das habilidades tanto na escola quanto fora dela. Em Piaget, este período corresponde à fase de centralização, onde a criança consegue perceber apenas um dos aspectos de um objeto ou acontecimento (estágio das operações concretas), ela não é capaz de relacionar a si mesma com os diferentes aspectos e dimensões de uma situação.

Para a inicialização da criança com o computador, é missão da escola atender a esse aprendiz, tornando significativo o seu aprendizado, enfatizando o “aprender” e não o “ensinar”, pois o conhecimento provoca mudanças e transformações.

Cabe ao educador tornar o computador uma parte do ambiente natural da criança, explorando todas as possibilidades que o computador lhes oferece, assim como afirmava Papert, trabalhando principalmente os softwares, em que grande parte da atenção está voltada, sendo eles: Logo, softwares educacionais, softwares de simulação e programação, softwares gráficos.

Para a aplicação dos softwares como ferramenta pedagógica, cabe ao educador considerar as competências intelectuais autônomas do ser - humano. Em Gardner, temos postuladas sete competências, ou inteligências múltipas, a saber: 1) inteligência lingüística; 2) inteligência lógico-matemática; 3) inteligência corporal-cinestésica; 4) inteligência musical; 5) inteligência espacial; 6) inteligência intrapessoal; 7) inteligência interpessoal. Gardner ainda explora uma oitava inteligência e, embora existam outras, ainda se encontram em fases de pesquisa.
Através da utilização do computador no processo educacional, diversas habilidades podem ser desenvolvidas simultaneamente, facilitando a formação de indivíduos polivalentes e multifuncionais, diferentemente.

Espera-se que sua utilização promova aulas mais criativas, motivadoras, dinâmicas e que envolvam os alunos para novas descobertas e aprendizagens, proporcionando aos mesmos autonomia, curiosidade, cooperação e socialização, principalmente quando da utilização da internet que possibilita diversos tipos de comunicação e interações entre as culturas de forma bastante enriquecedora.
Portanto, durante estes primeiros contatos, considerando o desenvolvimento intelectual e psicológico dessas crianças e o material pedagógico trabalhado durante este período, elas apresentam um comportamento de interesse e motivação, embora algumas se sentem apreensivas diante desse primeiro contato e de suas novas descobertas.

REFERÊNCIAS

ERICKSON, Erick. Infância e sociedade. Rio de Janeiro, Zahar, 1976.

GARDNER, Howard. Estruturas da mente: a teoria das inteligências múltiplas. Porto Alegre: Artes Médicas, 1994.

PAPERT, Seymour. Logo : computadores e educação. São Paulo: Brasiliense, 1988.

PIAGET, Jean. Aprendizagem e conhecimento. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1979.